Entre o Tudo e o Nada

No podcast de Joe Rogan com Bart Sibrel, do dia 25 de Abril de 2024, o convidado defende a ideia de que o homem não pisou na Lua em 1969.

Já é um ponto desprezado por boa parte do público; um evento considerado canônico na história humana sendo questionado. Ele traz diversos elementos para sugerir a validade de sua hipótese. Gravações de dentro do Módulo Lunar, fotos alteradas pelo governo americano, características físicas tanto da viagem quanto das imagens mostradas.

Considerando que já é um trabalho gigantesco você debater sobre um assunto considerado encerrado, você precisa ter habilidades de comunicação excelentes caso queira conversar ao vivo sobre o tema. Bart é um diretor audiovisual e jornalista, que ficou conhecido por seu filme “Uma coisa engraçada aconteceu no caminho para a Lua”. Neste filme, ele foi produtor, diretor e escritor. Ele passou anos de sua vida escrevendo sobre tal assunto, mas talvez aí se limite sua capacidade de expôr suas ideias. No podcast com Joe Rogan, Sibrel defende seu ponto de vista pobremente.

Fiz as seguintes observações sobre tal episódio:

1- Ficar afirmando que algo é verdade ou falso, não é argumento. Diversas vezes ele afirma que um registro é falso ou sem embasamento, sendo que ele mesmo não consegue demonstrar a infalibilidade de seus próprios argumentos. O constante acréscimo de “isso é verdade, isso não é verdade” parece um martelo acertando o mesmo lugar, independente do prego estar presente ali ou não, na esperança de que acerte o prego, ao invés da exposição sistemática e precisa, de uma martelada que prensa o prego de primeira.

2- Joe Rogan, no geral, interpreta os argumentos de maneira racional, identificando seus aspectos categóricos. Por exemplo: “dizer que essa foto é falsa não significa que a operação toda foi falsa”. Podemos dizer que o jornalista está sujeito à distorção cognitiva conhecida como “pensamento dicotômico”, onde a ideia é “ou é tudo, ou é nada”, sem avaliar os nuances entre o escopo apontado. A apresentador reflete sobre a dificuldade da operação em si e como isso acrescenta na dificuldade do registro audiovisual de tudo aquilo (nuance), portanto uma foto ou outra não são argumentos que sustentam a falibilidade de toda a operação (extremo do escopo), mas o convidado interpreta tais elementos como sólidos e suficientes para confirmar sua posição.

3- Sibrel questiona sobre o motivo de estar sendo questionado. Acho interessante o que isso sugere: que ele nunca realmente refletiu sobre o tema. Ele mesmo afirma que nunca teve um debate sobre.

Pensar depende de muito mais que sua própria cascata lógica, que sua própria visão de mundo, reafirmando suas ideias. Pensar é uma batalha.

Algumas possibilidades entre as interações de ideias:

-É possível que as partes entrem em um acordo que herda aspectos de todas;

-é possível que seja decidido que uma não se mistura com a outra, em um acordo que delimita fronteiras: por exemplo religião e ciência. Os objetos de estudo e reflexão de cada uma são excludentes entre si. Um método não extrai conclusões que sobrepõe as do outro, considerando os respectivos objetos de estudo. A ciência está preocupada com um método rígido, identificando variáveis e relações de causalidade cada vez mais consistentes, se perguntando apenas se “é possível? como é possível?”, não se preocupando com “deveria fazer isso?”. O objeto da religião é o valor moral. A ciência poderia palpitar sobre eventos dos textos religiosos, mas a materialidade deles não é objeto da religião. E a religião pode palpitar sobre a moralidade de aspectos científicos, mas em nada a crença afeta os resultados do processo científico. O observador não altera tanto o objeto observado;

-é possível que alguma das partes efetivamente perca, sendo a síntese herdeira apenas de um elemento do embate; Jordan Peterson comenta que às vezes o avatar, a persona imersa na simulação que você cria sobre o embate dessas ideias, pode morrer. Você não precisa pular de um precipício para saber a consequência, mesmo que apareça um impulso, uma vontade, de fazer isso. Ao simular essa possibilidade, o avatar que pula morre. Claro que isso, às vezes, é o avatar escolhido para orientar as ações de um indivíduo;

É um campo de batalha que existe desde as tradições orais, das quais temos acesso apenas às suas reminiscências. Richard Dawkins aborda a ideia de meme como sendo uma entidade replicadora que tem cérebros como seu alvo. Para os fins desta discussão, usarei que o alvo é o indivíduo, um termo com uma metafísica mais ampla, pois é mais fácil relacionar com a rede de ideias, com a rede de comportamentos intraverbais de cada um.

Toda vez que nos deparamos com uma ideia, seja uma estrutura complexa como uma escola filosófica, as concepções de um autor ou um conceito específico, ela entra em um outro ambiente de seleção, o indivíduo, onde algumas estruturas estão estabelecidas. Uma conversa é o encontro de duas redes de ideias, com relações diversas entre seus nódulos. Um meme pode ter relações entre nódulos diferentes para cada um. Portanto, possibilita a formação de novas relações entre nódulos, novas estruturas complexas.

Nós somos capazes de adotar diversas estratégias de avaliação, como por exemplo as leis da lógica propostas por Aristóteles, leis comportamentais, econômicas, naturais, premissas religiosas, a suprassunção Hegeliana e muitas outras. Elas irão influenciar drasticamente na maneira que cada um coloca os memes novos em teste. Além dos mecanismos de avaliação, também há a relação afetiva de cada um com as ideias, o que pode afetar a capacidade de análise e crítica dos fundamentos que as sustentam.

Esses mecanismos todos podem levar-nos a fazer comentários como “essas pessoas passando na frente da câmera não signica que tiraram um fita adesiva cuja função era simular a linha entre noite e dia no planeta Terra, além de não ser suficiente para dizer que toda a operação foi falsa” ou “essa pessoa, em 2014, falou que não existe a tecnologia para isso. Ou seja, não existia naquela época”, apesar do contexto do vídeo referenciado não deixar claro sobre quais os elementos que iriam ser afetados, a população ou certos aparelhos eletrônicos, que poderiam muito bem ser aqueles de registro, como câmeras.

A razão não é imune a erros, tornando difícil formular ideias isolado de um debate amplo e com pessoas de diversas áreas. Podemos nos aparelhar com diversas ferramentas cognitivas para selecionar nossas ideias, mas confrontar nosso pequeno grande arcabouço com o gigantesco arcabouço que existe quando duas pessoas conversam é, além de eficiente, lindo.

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