Extraia a ficção de suas crenças,
Sua subjetividade sobre aquilo que não apresenta nenhuma evidência
E o que sobrará será somente carcaça
Estudei
Trabalhei
E me casei por um propósito que se perdeu entre a complexidade dos meus pensamentos
E a fraqueza disso, que talvez não seja
Mas que insisto em chamar de alma
Por mais que eu tenha conquistado tudo!
Sem um propósito é como se eu não houvesse alcançado absolutamente nada!
Apeguei-me à inteligência dos livros
À sensação de sentido da ciência
À endorfina dos exercícios
Aos nutrientes das dietas
Às demais químicas nos comprimidos
E a todo restante da realidade!
Mas tudo o que garanti foi um corpo vigorosamente saudável
Abrigando uma alma completamente fria
Incontáveis são os que sofrem do desconforto
de simplesmente acordar
E ainda assim não existir
Os que sofrem da consciência de ter a própria existência
Equiparada ao último molar escondido na mandíbula de um ser da nossa espécie
Equiparada à inútil defesa dum réu de crime político
No tribunal de uma ditadura
Houve o dia em que me dispus a beber sozinho
E a de forma inevitável observar os outros seres
Como se tudo fosse óbvio
Eles se encontram, conversam e riem
Como se tudo fosse óbvio
Eles preenchem as cadeiras dos botecos
Sem sofrer da necessidade de se perguntar o por quê de fazer isso
Mas eu, feito idiota
Me pergunto o tal motivo
A solução da Natureza
Para as perguntas de uma mente sem respostas
Foi criar um mecanismo de defesa
Cujo propósito é simplesmente: crer
Mas eu, feito idiota
Me pergunto e não acredito
Bêbado
Roguei aos céus, aos santos, aos deuses, a Deus!
Ao mais clichê dos entes metafísicos!
A solução não veio
Sóbrio
Vencido!
Desacreditado, mas com o profundo desejo de conseguir acreditar
Atravessei o parapeito de uma ponte para tremendo
Mirar a minha queda:
– “Não! Não posso.”
Ah! Mas nem que eu pudesse!
Se eu tivesse a coragem para o último passo em direção à súbita não-existência
A redirecionaria para viver na sensação de estranheza deste mundo
Sem respostas
Sem consolo
Sem metafísica
E da persistência que ela tem em continuar existindo como sonho
Do meu sofrimento na sua ausência
Tenho a certeza de que a metafísica é um fruto da evolução
Servindo como método para organização
Do caos e sua estranheza
Muito bom, Marcos!
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Profundamente profundo e eu digo mais, é consegui enxergar a mim mesmo. Olhando de cima da ponte , não sei quem você é, mas apesar de ser o desconhecido pareceu que me conheces bem. Parabéns
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Baita texto parabéns, me lembrou o filme A felicidade não se compra, um homem está numa ponte e vai ar o passo, um anjo aparece e mostra como a vida dele foi, é importante, muito bom, clássico dos anos 50, 60 acho. E no fim, acho, que crer ou não é “apenas” uma escolha. Cada um faz a sua e no seu tempo, nenhuma pessoa poderá lhe convencer disso ou daquilo, penso que é um momento uma escolha que a pessoa fará entre o Deus ou o nada…
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Estranho este teu poema por uma questãozinha besta. Ora, veja você, poeta, o caso é que você comenta, comentou sobre uma visita que lhe fez a metafísica! E eu, veja só, euzinho, estava lendo, estou lendo o PÓS DEUS de Peter Sloterdijk. E nosso bom Peter comenta que a aventura humana no mundo, muito antes de poder ser lida à luz da metafísica (modernamente, diríamos ontologia) deve ser lida à luz do Direito. Sloterdijk escreve que a aventura do homem sobre a terra deve ser lida à luz do Direito como um contrato. Um empréstimo. Deus todo-poderoso nos empresta a alma (você também pode falar do Ser. A modernidade, essas coisas…). Ao fim e ao cabo, por outra, morremos e aí o Senhor nosso Deus recebe a alma de volta, vez que emprestada. Aí verifica o Senhor (nosso deus, você sabe) se a alma está intacta, tal como foi entregue ao vivente (…o locatário se compromete a entregar o imóvel no estado em que o recebeu…). E, ó terror, se não íntegra a alma o Senhor, o locador último, pode nos punir por quebra contratual. Falei, escrevi, demais. O senhor (que é você, poeta) me perdoe a prolixidade. Infinilhões de abraços, se me permite a citação perrengue de Guimarães, o Rosa.
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Republicou isso em MasticadoresBrasil Editora: Miriam Costa Fundador j re crivello.
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Oi Marcos! Te publiquei na revista global acima… gosto muito desse teu texto!
Espero que estejas bem…. continua escrevendo.
Bjs
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Que baita poema! Bravo!
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Curti. Tem aquele jeitão de poesia marginal, adoro!
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Muito belo! Aqui na IS Editora ainda não publicamos nenhum livro vindo de blogs… #ficaadica rsrsrs
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Muito lindo e profundo!! Obrigada por compartilhar a sua reflexão.
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